reflexão em dias de eleições
Por Guilherme Portanova*, Jornalista
Durante o período eleitoral, a democracia aparece como garantia do bem geral da Nação. Tão natural bater na tecla da ‘festa democrática’ que dificilmente saímos do senso comum. Na prática, ‘democracia’ é o direito de ir à urna votar e só. Nosso imaginário não voa além disso e democrático passa a ser o país que realiza eleições regularmente. Quanto mais parecido com os EUA, melhor. Copiar o modelo norte-americano virou exemplo de virtude, mesmo que aquele seja um processo cheio de pontos de interrogação ao que se refere à democracia de fato.
Arrisco olhar diferente. Para ser candidato, é preciso convencer setores políticos e financeiros. Raros vão direto ao povo ou emergem dele. A viabilidade real depende da costura de interesses.
Quem confirma o valor democrático não é a regra eleitoral, mas os grupos de poder que acotovelam-se por espaço, verbas, emendas, influência e o direito de dar as cartas na mesa dos jogos políticos. Como o apoio dado hoje é cobrado amanhã, o conceito de democracia sofre um abalo.
Junte-se a isso o fato de que exercemos a “democracia” de tempos em tempos e, nos intervalos, a tarefa fica a cargo dos representantes que, não raro, decidem de forma diferente da defendida na campanha. No dia a dia acabam não importando muito, pois o exercício da democracia começou no primeiro turno das eleições e foi esgotado junto com a propaganda, no segundo.
Só que as coisas não precisam mais funcionar assim. A tecnologia já permite que votemos diretamente via celular com segurança. Os aplicativos de bancos contam com segurança comprovada e mecanismos semelhantes podem ser adotadas para evitar fraudes.
Imaginou? Podemos decidir por aplicativo.
Agora pense em como ficaria o Legislativo, caso os eleitores fossem convocados para decidir a cada nova proposta importante. Em vez de delegar aos parlamentares, nós mesmos teríamos prazo para votar diretamente na reforma da previdência, por exemplo. Um efeito seria imediato: uma vez que a decisão dos temas mais importantes fosse do cidadão, o parlamento concentraria esforços em fiscalizar os outros poderes e criar projetos para que fossem submetidos à escolha popular.
Funcionaria de outra forma. Os parlamentares estudariam temas, criariam os projetos e se esforçariam para convencer os cidadãos de que aquele caminho proposto é o melhor para o país. A partir daí, a decisão seria pelo voto direto. Acabaria a possibilidade de fazer lobby por aprovações, uma vez que o poder de decisão não seria mais da bancada. Recairia a ela, a defesa de determinado argumento que estivesse de acordo com sua linha ideológica. Ambientalistas defenderiam a sustentabilidade, trabalhistas discursariam pelos direitos dos trabalhadores, liberais argumentariam em nome da livre concorrência. Tudo certo, mas a decisão seria do povo. Ah... antes que esqueça. O executivo teria a obrigação de investir muito em educação, pois o povo sem esclarecimento seria capaz de botar tudo abaixo em poucas votações. Seria um desafio.
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