Mitos, modismos e propostas para pensar a criatividade, com o apoio de Isaac Asimov
Por Carol Assunção, Jornalista, pesquisadora em conteúdo audiovisual, Doutora em Linguística do Texto e do Discurso
A raiz latina do verbo criar (creare) remete a ações como fazer, produzir, formar, e aparece com frequência em situações que exigem novidade e/ou solução de problemas. O termo inglês insight (com traduções que variam entre visão, percepção, discernimento, conhecimento) foi incorporado como mais um corriqueiro "estrangeirismo" à prática e à cultura profissional da Comunicação, entre outras áreas. Quando se tem uma ideia considerada válida durante um processo criativo, lá está o insight na boca de quem o apresenta.
Belamente representada por musas gregas portadoras de inspiração, como Calíope e Clio, a criatividade não é restrita a raros e selecionados mortais. Há mais pertinência em entender que Ela (já nos referimos a uma entidade sem nos darmos conta) depende de habilidades e competências que exigem esmero. O escritor e cientista Isaac Asimov, cujo centenário celebramos neste ano, publicou um ensaio para problematizar o mistério do surgimento das novas ideias, com apontamentos no mínimo curiosos e provocadores:
"Uma maneira de investigar o problema é considerar as grandes ideias do passado e ver como elas foram geradas. Infelizmente, o método de geração não é claro nem mesmo para os próprios 'geradores'". (Isaac Asimov)
Ele vai muito além nessa reflexão. Para entender a origem das tais novas ideias, menciona traços pessoais como: autoconfiança para nadar contra a corrente, boa formação na área em que atua, cultivo de hábitos pouco convencionais, fluxo mental que requer isolamento (mas não o tempo todo). A pessoa com essas características, me parece, é alguém capaz de desconstruir amarras que não existiam na infância, mas que recalcamos ao longo dos anos, por meio da vida escolar, familiar, institucional etc. Isso explicaria a dificuldade e a suposta raridade dos "espíritos" criativos entre adultos, talvez? Donde os traços que rodeiam a mitologia e o estereótipo de gente inovadora: pessoas excêntricas, malucas, antissociais, esquisitas. Diferentonas.
Entretanto, a principal observação de Asimov não diz respeito a manias e maneirismos de personalidade. O sobressalto do ato criativo, segundo ele, concerne à capacidade e à ousadia de olhar para fenômenos ou coisas diferentes e estabelecer relações imprevistas, porém plausíveis, entre eles; e, assim, chegar a algo novo. Por consequência, num processo criativo coletivo, não se trata de agrupar pessoas que vão chegar juntas a uma nova ideia, mas sim unir integrantes capazes de combinar, mutuamente, o aparentemente "incombinável".
E como reunir uma equipe criativa? Grupos pequenos, com participantes descontraídos, despojados dos filtros de determinados tipos de julgamento. Uma liderança meio psicanalista, capaz de conduzir os colegas a resultados via perguntas. A receita de Asimov: "Parece-me necessário, então, que todas as pessoas em uma sessão estejam dispostas a parecer tolas e ouvir as outras parecerem tolas." Ele também sugere a realização de encontros em locais informais, com alternância dos participantes, para variar a toada...
Apesar de parecer um talento limitado, a competência para flexibilizar o olhar em busca de perspectivas inusitadas e o poder de associação e articulação dos elementos podem ser adquiridos com o tempo, a experiência, a prática e algumas técnicas e exercícios.
No caso da publicidade, por exemplo, a necessidade de juntar criatividade e inovação na condução de processos de branding é uma constante. Porém, construir esse tipo de trabalho de forma realmente criativa e inovadora é um baita desafio.
Uma atividade eficaz para o estímulo criativo é a navegação por plataformas de curadoria e conteúdo. Há pouco tempo, descobri a Future London Academy (FLA). Tenho consultado regularmente o site, o perfil no Instagram e o Canal no YouTube, com entrevistas e rodas de conversa sobre vários assuntos, entre eles um vídeo muito interessante sobre "Como aprender qualquer coisa?" (se você não entende inglês, dá para colocar legendas automáticas em português). A FLA também organiza eventos pagos como a Future of Branding Week Live, agendada para 20 a 24 de julho.
Nesse vídeo, conheci o trabalho da agência Buck de criatividade, que segue bem a linha proposta por Asimov, da combinação eficiente, livre, leve e solta, com resultados.
Outro site que frequento há muitos anos é o Brain Pickings, da Maria Popova. Ela faz uma curadoria cuidadosa e diversificada - poética, literária, filosófica, científica e artística. Recomendo, por exemplo, o lindo texto How to find your artistic voice (Como encontrar sua voz artística).
E para terminar com um filme, sugiro o documentário Como o cérebro cria (The creative brain, 2019), do neurocientista David Eagleman (NETFLIX), sobre como e por que a criatividade não é um dom, mas o resultado do constante esforço do pensamento:
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